Precisamos revolucionar a educação no Brasil.
Para tanto, é útil sabermos o que países com bons resultados nesse campo
têm feito. Estudo sobre o sistema educacional finlandês, classificado
entre os primeiros no mundo, revela que as seguintes medidas, naquele
país, tiveram impacto decisivo sobre a qualidade da educação:
Os
requisitos para ingresso em cursos superiores voltados à formação de
professores são bastante rigorosos. Os programas de formação são
fortemente baseados em pesquisa (exigindo-se a apresentação de
dissertação de mestrado), possuem forte componente prático (com
exigência de estágio em escolas municipais), além de darem ênfase
particular a métodos pedagógicos relacionados à identificação e ao
acompanhamento de alunos com dificuldades de aprendizagem. Os salários
são bons, embora inferiores à média de outros países com sistemas
educacionais de qualidade. Os professores têm razoável grau de autonomia
e desfrutam de grande prestígio. A carreira docente é cobiçada e apenas
os melhores alunos, no ensino médico, conseguem ingressar em cursos
para a formação de professores.
A oferta do ensino fundamental é
de competência dos municípios, que têm autonomia para gerir recursos
nessa área. Exige-se, no entanto, que todas as escolas, sem distinção,
ofereçam educação de qualidade. A homogeneidade, a despeito da
descentralização, parece ser garantida pelo forte investimento na
formação de professores.
A atenção a alunos com dificuldades de
aprendizagem é um dos pilares do sistema finlandês. Alunos que
requeiram atenção especial são precocemente identificados por
professores especializados, de modo a evitar que acumulem grande
defasagem. Atendimento complementar (individualizado ou em grupos) é
oferecido em todas as escolas, se necessário com apoio de enfermeiros,
psicólogos ou assistentes sociais. Para casos mais graves, há escolas
especiais. ?A matrícula nessa modalidade?, segundo Tatiana Britto,
autora do estudo mencionado, ?depende de decisão do conselho municipal
de educação, baseada em laudo psicológico, médico ou de assistente
social, ouvidos obrigatoriamente os pais ou responsáveis. Nesse caso, os
alunos seguem planos de aprendizagem customizados, com vistas a
alcançar resultados de aprendizagem definidos caso a caso?. No ano
escolar de 2008-2009, quase um terço dos alunos finlandeses recebeu
algum tipo de atendimento especializado. Não se trata, portanto, de
procedimento excepcional voltado apenas a casos graves. Trata-se de
impedir que dificuldades leves e comuns, acumuladas ao longo do tempo,
deem origem a disparidades desnecessárias de desempenho entre crianças
igualmente dotadas de capacidade de aprender, embora em ritmos e
condições distintas.
Com relação a testes e avaliações, deve-se
notar que a Finlândia destoa de países que têm adotado programas
incisivos de mensuração de resultados. Não há, naquele país, rankings
entre estabelecimentos de ensino, nem bônus para professores por
resultados alcançados. Segundo Britto, ?na visão de muitos educadores
finlandeses, a pouca ênfase dada a avaliações padronizadas permite fugir
do incentivo perverso de reduzir o ensino à preparação para os testes,
permitindo uma abordagem mais ampla e aplicada dos conteúdos
curriculares e a salvaguarda das prerrogativas de autonomia,
criatividade e independência profissional do docente?.
A
Finlândia construiu um sistema educacional de qualidade, público e
gratuito, ao longo de quase três décadas. Reformas com longo prazo de
maturação foram sustentadas no decorrer de muitos governos em virtude de
?consensos pluripartidários e sociais, mobilizando atores políticos
diversos no debate e na implementação das decisões?, ainda segundo
Tatiana Britto. De forma notável, o país dispensou modelos de inspiração
empresarial que estimulam crianças e escolas a competir. A dedicação
individual é estimulada num contexto cooperativo, evitando-se a pressão
excessiva, hoje visível em muitas escolas, e que encurta a infância sem
dar origem a jovens preparados para os desafios da vida real, seja no
âmbito das relações interpessoais, seja no âmbito mais amplo da
cidadania.
O exemplo finlandês demonstra, em resumo, que não
existem atalhos. Educação de qualidade requer investimentos com longo
prazo de maturação, orientados por uma visão adequada. Se queremos um
país próspero, democrático e criativo, precisamos de escolas que
promovam a excelência, respeitando diferenças, nas quais a cooperação
prevaleça sobre a competição, sob a liderança altiva de professores
qualificados, prestigiados e bem remunerados.
O estudo
mencionado neste artigo foi publicado em maio de 2013 pelo Núcleo de
Estudos e Pesquisas do Senado Federal. Encontra-se disponível no
endereço www.bit.ly/educacaofinlandia.
Felipe Dittrich, sociólogo graduado pela Unicamp e funcionário do Ministério das Relações Exteriores.
Da Gazeta do Povo
Nenhum comentário:
Postar um comentário